Opinião de Maria do Céu Patrão Neves
Não, não sou daquelas pessoas que se lamuriam porque os seus filhos, porque muitos dos nossos jovens (ou menos jovens…) emigram para encontrarem uma actividade profissional que corresponda às suas aspirações ou tão simplesmente o emprego que não encontram em Portugal. E também o meu filho está longe… O mundo de oportunidades é hoje sem fronteiras e toda a experiência ganha para além do nosso quintal enriquece quem parte e também a pequena comunidade em que cada um de nós vive pelo muito que traz quem regressa ou a ligação com quem permanece distante.
Além disso, sempre fomos emigrantes, itinerantes, cidadãos do mundo, construtores de um Portugal global a que nos orgulhamos de pertencer.
Mas esta minha posição, eventualmente controversa e assumida com transparência, não me impede (antes me coloca à vontade) de retomar na minha crónica a polémica frase de António Costa, proferida este mês em Paris: “É também uma oportunidade de trabalho para muitos professores de português que, por via das alterações demográficas, não têm trabalho em Portugal e podem encontrar trabalho aqui”.
Timidamente no início, mas ganhando força depois, surgiram as comparações públicas com um designado “apelo à emigração” de Passos Coelho em 2011 quando este afirmou: “Sabemos que há muitos professores em Portugal que não têm nesta altura ocupação e […] querendo-se manter, sobretudo como professores, podem olhar para todo o mercado de língua portuguesa e encontrar aí uma alternativa.”
Não pensem que vou criticar António Costa pela sua frase, como não critiquei Passos Coelho pela sua. Para mim é evidente que ambos têm razão: há oportunidades fora de Portugal que não podem ser ignoradas e afirmá-lo não corresponde ao apontado “apelo à emigração”. Considero até que um jovem hoje, mesmo que tenha trabalho em Portugal, deve fazer uma prospecção pelo menos do mercado europeu para ver se não encontra algo mais aliciante não só em termos financeiros, mas também de formação complementar, de oportunidade de promoção, de diversificação de experiência, etc., etc.
O que critico neste dito “apelo à emigração” é o sectarismo e o servilismo, a par da desonestidade intelectual, dos nossos fazedores de opinião, desde jornalistas a comentadores encartados, para além de muitos cidadãos ideologicamente comprometidos, e principalmente do actual Primeiro-ministro que, com total despudor, avaliam diferentemente o igual só porque foi proferido por pessoas distintas. À esquerda muito é permitido do que à direita é proibido.
E esta é uma experiência quotidiana na nossa política nacional também fortemente agravada pelas tendências das nossas elites intelectuais que, mais uma vez, fazem opinião colocando rótulos às diferentes personalidade públicas. Muito é permitido a quem tem boa imagem pública, que é proibido a quem tem má imagem.
Vejam, por exemplo os elogios rasgados de todos os partidos políticos, e da nossa comunicação social também, ao apelo à unidade e convergência do Presidente Marcelo quando, há poucos meses, o mesmo discurso pelo Presidente Cavaco Silva era classificado pela esquerda como manipulador e pela comunicação social como inútil…!
Muitos dirão que é simplesmente assim e que já estamos habituados; eu direi que há realidades às quais nunca nos devemos habituar! Eu não me quero habituar a que o justo ou injusto, o pertinente ou impertinente, o necessário ou desnecessário sejam avaliados não pela substância mas pelo autor. Não quero que as palavras e os actos sejam avaliados subjectivamente conforme o autor; quero que o autor seja objectivamente avaliado pelas suas palavras e pelos seus actos.
Vêm aí eleições… Pensem nisto…