Um 1º de Abril tardio

Opinião de Maria do Céu Patrão Neves

Patrão NevesNão, não é dia 1 de Abril, não é o “dia das petas” mas é como se fosse. A Comissão Europeia, no âmbito da sua suposta política para os refugiados, anunciou uma proposta de multas para Estados-membros e para refugiados também que dificilmente pode ser levada a sério!

Sob o eufemismo politicamente correcto de “contribuição solidária”, a ideia é impor uma multa aos Estados-membros que não cumpram as suas respectivas quotas de acolhimento de refugiados a qual pode ascender a 250 mil euros por refugiado. A recusa de acolhimento de uma família de refugiados constituída pelos pais e dois filhos, isto é, quatro elementos, poderia assim custar um milhão de euros ao Estado-membro.

Numa Europa em que ninguém sabe ao certo quantos refugiados já entraram ou onde muitos deles estão, em que vários Estados-membros estão a adoptar medidas restritivas apoiadas pelas suas respectivas populações e em que os movimentos xenófobos anti-imigração vêm crescendo, em que se erguem muros nas fronteiras e se propõe confiscar os bens dos refugiados, não é credível que algum Estado-membro venha a pagar o que quer que seja pelas opções que vier a tomar em relação aos refugiados. E se esta medida se apresenta como uma forma de pressão para o acolhimento forçado, dito “solidário”, dos refugiados, ela apresenta-se tão irrealista que nem um efeito dissuasor pode desempenhar.

Aliás, se dúvidas tivéssemos em relação à exequibilidade da proposta em relação aos Estados-membros, não as teremos certamente em relação aos refugiados a serem igualmente multados caso apresentem o seu pedido de asilo em mais de um Estado-membro. Mas afinal – expliquem-me – os refugiados não são fugitivos de guerras, perseguições, miséria e ausência de condições para sobreviverem…? Não são despojados de praticamente tudo? Então como é que dispõem de dinheiro para pagar multas à Comissão Europeia?!

E sobra ainda uma questão sobre a qual gostaria de ouvir a Comissão: os Estados-membros, como Portugal, que até se voluntariam para acolher refugiados, cujo embaixador até viajou para tentar convencer os refugiados a virem para o nosso país, mas que, mesmo assim, não conseguem cumprir a quota que lhes foi atribuída, em vez de pagar poderão antes receber o equivalente da multa por refugiado pelos que estão em falta…?

Não, obviamente esta proposta não é para ser levada a sério e não poderá reunir o acordo de dois terços do Conselho Europeu ou a aprovação simples do Parlamento Europeu. Mas se tal acontecesse, por uma daquelas bizarrices de estratégia política que, regra geral, apenas descredibilizam a política, ninguém pagaria as multas, nem mesmo os Estados-membros que possam vir a votar a proposta favoravelmente.

Qual então a razão de ser de semelhante proposta tão inverosímil que roça o ridículo? Na ausência confessa de qualquer ideia inteligente, e tendendo mais a cair na flacidez da lógica da Comissão Europeia, avançaria com a sugestão de semelhante razão consistir no que podemos designar como “prova de vida”: é uma proposta, algo absurda é verdade mas, ainda assim, uma proposta que serve para mostrar que a Comissão, afinal, está a investir numa política para os refugiados. Desculpem-me, mas não me ocorre mais nada!

 

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