O tabu que nos une

Opinião de Inês Sá

Ines SaO convite chegara-me por um ex-colega com quem me havia cruzado há 10 anos atrás, no meu segundo emprego em terras açorianas. O projeto era criar uma associação (obviamente sem fins lucrativos) de pais e amigos de crianças com Necessidades Educativas Especiais (N.E.E). É certo e sabido, pelo menos por aqueles que comigo convivem, que enquanto mãe de duas crianças e com um marido sem horário pré-definido, o meu dia tem os minutos rigorosamente controlados, principalmente a partir do momento em que termino o meu horário laboral. A correria começa no caminho para ambas as escolas, depois distribuí-los pelas respetivas atividades físicas, regressar a casa, e começar a rotina que todas as mães tão bem conhecem. Estranhamente nada disto me fez hesitar, nem tão pouco ponderar. Saber-me na possibilidade de eventualmente poder contribuir para tornar menos pesada a vida de alguém, fez com que de imediato aceitasse este desafio. E disponibilidade? Não tenho, mas sei que vai aparecer, até porque nunca duvidei da responsabilidade que assumo em tudo aquilo que faço. Como diria um amigo meu, “deixa que a vida resolve”, e a verdade é que sempre tem resolvido.

O meu primeiro e único contato com as N.E.E foi já em solo açoriano, no meu primeiro emprego, na Casa de Saúde de S. Miguel, já lá vai mais de uma década e ainda hoje sinto uma imensa saudade daquele pequeno mundo despido de tudo aquilo que no nosso mundo parece indispensável, onde unicamente transborda a gratidão daqueles que humildemente se sentem um pouquinho melhor na nossa companhia, com apenas o nosso sorriso, na ansia de um abraço. Não me canso de repetir que todos nós deveríamos ter a oportunidade de conhecer aquela instituição, viver o dia a dia dos seus utentes, privar com profissionais de enorme valor, sentir aquilo que os move e o quão são felizes com tao pouco. Fica o desafio às escolas e ATL para que passem a considerar esta instituição nas suas visitas de estudo. Diz-me a minha experiência que o primeiro contato não é fácil, afinal toda aquela realidade era totalmente desconhecida para mim, mas após quebrado o gelo, é magnifico, é gratificante, é infinitamente prazeroso, fica para a vida, acreditem.

Chegada finalmente a primeira reunião desta associação e após conhecer a comissão instaladora, fico a saber que entre todos, existem pais e mães de meninos com N.E.E e é naturalmente isso que impulsiona este projeto. Tinha que saciar a minha curiosidade e tentar entrar neste mundo até então totalmente desconhecido para mim, por isso pedi-lhes que partilhassem as suas motivações, os seus projetos, o que de fato se espera da constituição desta associação.  É evidente alguma mágoa para com o sistema, ou melhor, para com o imenso percurso que estes pais têm de fazer até chegar àquela pessoa que os vai ajudar a lidar com o problema do seu/sua filho(a). São relatos no mínimo dolorosos de quem se vê a braços com um filho(a) que não acompanha aquilo que é definido como o desenvolvimento normal de uma criança, muitas vezes contrariando a vontade de quem quer revirar o mundo ao contrário para ajudar o seu filho(a) e a cada passo se depara com os mais diversos entraves, desde a burocracia ou diagnóstico, aos exames, entre outros. Perante todo este reboliço de angustias e este emaranhado de possíveis trajetos, os pais acabam muitas vezes por se socorrer uns dos outros e, através da partilha de experiências, conseguem não só entender e descobrir na 2ª pessoa o que se passa afinal com o seu/sua filho(a), como descartando etapas desnecessários na sua procura por ajuda especializada.

É exatamente esta partilha, mas não só, que “A Casa Né – Associação Em Rede De Pais E Amigos De Crianças E Jovens N.E.E” pretende incentivar, desenvolvendo estratégias para promover uma primeira ligação com os pais, familiares e amigos de crianças e jovens portadores ou em avaliação de NEE e Perturbações do Desenvolvimento e/ou Comportamentais (PD/C). Para tornar este nosso sonho possível, é fundamental o depoimento de todos aqueles que vivem esta realidade das N.E.E, é urgente acabar com o tabu que cerca o assunto e que dá uma conotação depreciativa a estas crianças, quando a diferença que nos une é simplesmente o facto de estas serem especiais!

 

http://casaneacores.wix.com/casa-ne

 

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