Entendam-se, o país está primeiro!

Opinião de Maria do Céu Patrão Neves

maria_do_ceu_patrao_nevesQuando quase uma semana depois das eleições legislativas não temos um Primeiro-Ministro indigitado para formar Governo, num país frágil, muito frágil, vulnerável, muito vulnerável, é impossível que me proponha reflectir publicamente sobre qualquer outro tema que não o do rescaldo das eleições.
Quando os acontecimentos políticos se sucedem em catadupa, com múltiplos actores e emitindo sinais contrários, qualquer reflexão sobre o momento presente é rapidamente ultrapassada por nova bizarrice e torna-se desactualizada da manhã para a tarde.
Mas, todavia, há factos que perduram e há gestos que marcam…
A voracidade de interpretações criativas, ditadas por uma militância cega e inconsequente, não apaga a realidade dos factos: a coligação PSD/CDS ganhou as eleições legislativas e em 40 anos de democracia portuguesa, como aliás em qualquer país democrático, quem ganha as eleições é responsável pela iniciativa de formar governo. É incompreensível, além de incoerente e contraditório, que quem perdeu as eleições se coloque agora “em bicos de pés” para chegar ao poder, maquinando estratagemas que rotulam de democráticos para estropiar o voto livre dos portugueses.

O Presidente Cavaco Silva ainda não indigitou o líder da coligação vencedora a formar Governo (apesar da nossa esquerda, e até comentadores supostamente informados e sérios, o criticarem despudoradamente por o ter feito). E podia tê-lo feito. Era, aliás, o que esperava a maioria das pessoas que se mantêm racionais e objectivas, na alucinação retórica que tomou conta do nosso país. Porém, o Presidente voltou a surpreender, pela positiva (a história não deixará de lhe fazer justiça!), tal como já antes o tinha feito, pressionando os partidos políticos para um amplo consenso nacional de governo. É coerente e coloca o país acima de todos os interesses partidários, o que parece incomodar muita gente. Qual será a resposta dos partidos…?
E a resposta esboça-se sob a forma de gestos que vão assinalando um caminho e que não se apagam. Quem esqueceu, por exemplo, o gesto de desencadear uma luta fratricida pelo poder socialista com o pretenso argumento de que a vitória do então líder era “poucochinha”, ou o de agora de, perante uma derrota estrondosa, não se demitir? É este líder, enfraquecido pela derrota e descredibilizado pela incoerência das atitudes, que traça gestos no presente em nome de um partido que se reivindica de charneira mas que está a reboque de um mau perdedor. E ele multiplica gestos que colocam em causa a herança do partido socialista de que (apesar de efemeramente) deveria ser fiel guardião mas que ameaça comprometer.

Primeiro critica o Presidente da República sem que se perceba porquê, uma vez que reconhece não ter este indigitado um Primeiro-Ministro e estar a exercer a pressão para que os partidos do arco da governação, isto é também o PS, construam uma plataforma de entendimento estável para a governação do país. O desrespeito institucional não é uma estratégia em que partidos responsáveis se revejam; neste caso é esquizofrénico pois a opção presidencial favorece o PS. Outro gesto intencionalmente marcante foi começar por se reunir com o PCP, provavelmente o partido comunista mais ortodoxo da Europa e mera quinta força política no actual espectro nacional com um total de 8% de votos. É esta a prioridade do partido socialista?!.
Só posso supor que se trate de uma estratégia para ganhar força negocial com a coligação mas mesmo como tal é arriscada. É arriscada para o PS, sendo impensável que militantes ou simpatizantes advoguem maioritariamente ligações à esquerda radical em que o partido nunca se reviu. O risco já iminente de fractura interna aumenta o que sendo negativo para o PS, arrastará consigo o seu líder, de forma mais rápida e hostil do que a já inevitável. É, pois, arriscada também para o líder socialista. Mas importo-me muito mais por ser arriscada para o país: internamente, protela a construção de um caminho necessário e urgente, externamente, acrescenta uma nota de indefinição e instabilidade que afectará a credibilidade a custo de todos nós conquistada.

O tempo não é de jogos mas de consensos. Entendam-se a bem do país!

 

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