Em pleno Séc. XXI não é mais possível aceitar passivamente um estado, que se diz democrático, onde a liberdade de expressão vai perdendo a cada segundo o seu lugar de destaque. É escandalosamente notória a opressão das vozes mais incómodas, dos pensamentos mais realistas, das contrariedades inconvenientes, das situações que por qualquer motivo não se enquadram no cada vez mais frequente e inquietante “está-se bem!”.
A cada dia que passa aumenta a minha perfeita estupefação quando confrontada com as mais disparatadas convicções e ausência total de opinião, daqueles que se convertem e constituem os comummente designados “yes man!”. Talvez seja até esse o lado da política ativa que mais me repugna, a obrigação moral a que todos se rendem rumo à unanimidade ideológica, para assim cantarem a uma só voz. Custa-me a crer, por exemplo, que essa unanimidade exista na realidade em todas as matérias, mas mais me custa entender aqueles que discordando não ousem falar, cumpram e façam cumprir com rigor a sua disciplina de voto e o delito de opinião, emitindo porventura um ou outro sussurro envergonhado, totalmente submissos seja qual for a palavra de ordem. Não é desta forma que considero o pleno exercício da democracia.
A capacidade dos verdadeiros “yes man” de inverter por completo a interpretação de uma qualquer situação menos abonatória à sua ideologia política, é no mínimo assustadora e contribui decisivamente para que o assunto em causa caia em total descredito. Paralelamente, lá acabam por surgir, a conta-gotas, uma ou outra voz mais corajosa que ousa prevaricar e transgredir a linha orientadora superiormente instituída. E nada mais é necessário fazer para que a tropa se coloque em sentido, armas apontadas, máquina mobilizada, e é a morte do artista, do especialista, do companheiro, do amigo, do camarada, que já tantas lutas ajudou a combater. Mas nada disso tem valor naquele instante, importante mesmo é conseguir influenciar a opinião pública de que estamos perante uma traição à pátria, de que se um dia aquela voz fez parte do coro, hoje deverá ser expulsa pela sua (brilhante mas interdita) liberdade de expressão!
Sejamos realistas. Nenhum partido é capaz de vencer em todas as frentes, nenhum partido cumpre com a totalidade das suas promessas, nenhum partido alcança tudo aquilo a que se propõe. Mas então porque se recusam com tanta veemência em assumir as suas falhas, as suas derrotas, os seus incumprimentos, os seus erros? Desenvolvem grandes teses para pintar de branco um buraco negro, escondem debaixo do tapete aquilo que já foi visto e revisto por todos, mentem com a naturalidade de quem acredita profundamente no que está a dizer, trocam zeros por euros para que o resultado soe melhor, modificam o texto alegando ser apenas uma síntese, assumem que nós somos tolos quando o correto era assumirem que às vezes podemos até parecer distraídos!
A falta de humildade inerente a este tipo de comportamento, já tão socialmente aceite, ameaça toda a humanidade e certamente influenciará a forma como esta se irá movimentar doravante. A falta de caracter, a robustez da mentira, o desleixo, a permanente desresponsabilização por parte daqueles que mais têm responsabilidade no nosso quotidiano, a cegueira convenientemente momentânea, a moralidade fingida, o esquecimento propositado, o egocentrismo, a indiferença, corporizam o estado de uma nação, da nossa nação!