A expressão “canto das sereias” é-nos bem familiar. Alguns não saberão que se trata uma narrativa da mitologia grega: as sereias, seres mitológicos metade mulher e metade peixe, exerciam uma poderosa sedução nos marinheiros que, atraídos pelo seu magnífico canto, se aproximavam demasiado, acabando por se descuidar e naufragar. Porém, ninguém terá verdadeiramente dúvidas sobre o que evoca: o “canto das sereias” constitui hoje uma metáfora para o encantamento que discursos ilusórios exercem sobre alguns conduzindo-os entretanto à desgraça.
Não é necessário qualquer esforço de raciocínio ou recurso estilístico para passar da mitologia grega para a actualidade grega. O Syriza, a sereia de hoje, prometeu o que não tinha mas era de outros, prometeu o que não dependia de si mas de outros. Anunciou o que as pessoas desejavam ouvir mas não era possível. Vendeu esperança quando só tinha ilusões. Agora tem sido obrigado a reconhecer o mito e enfrentar a realidade, mas a desgraça é iminente…
Outros povos europeus resistiram ao “canto das sereias” e evidenciaram outro apego à realidade. Refiro-me às opções feitas no mês de Maio nas eleições legislativas no Reino Unido e nas eleições municipais e autonómicas em Espanha. Quando no Reino Unido se anunciava a ingovernabilidade decorrente de um quase empate entre Conservadores e Trabalhistas, até às vésperas das eleições, os ingleses deram uma maioria absoluta ao Partido Conservador, o mesmo cuja governação dos últimos cinco anos foi marcada pela rígida austeridade nas contas públicas, através da qual conseguiu o maior crescimento na Europa e a diminuição da taxa de desemprego, entre outros índices positivos.
Em Espanha, anunciava-se a vitória dos movimentos ditos de cidadãos, por oposição aos partidos já tradicionalmente estruturados, o PP e o PSOE. E, no entanto, apesar de fortes quedas, os Populares e os Socialistas mantiveram as suas posições, situando-se os partidos dos cidadãos na terceira posição. A vitória do partido conservador do governo, protagonista da austeridade em Espanha e da já visível recuperação espanhola, mostrou, mais uma vez, que é possível impor a realidade ao canto da demagogia e do populismo.
Também Portugal caminha para eleições. Também em Portugal as sereias cantam. O que importa agora é saber se nos deixamos encantar pelas palavras que traçam um imaginário sedutor mas ilusório, ou se assumimos a maturidade de uma escolha realista, com as dificuldades inerentes, mas também com ganhos assegurados. Dito à portuguesa, preferimos “um pássaro na mão ou dois a voar”?