Apesar das minhas muitas e generalizadas convicções, dificilmente me identifico com extremismos de qualquer natureza. Concordando ou não, na falta de consenso, conscientemente esforço-me por entender em que se baseiam os diversos fundamentos apresentados pelas partes. Entendo por isso ser fundamental o debate de ideias, o espirito crítico, o livre pensamento, o conflito moderado, a discussão em torno das diferentes crenças, em suma, a existência de um saudável confronto de ideais que nos eleve e estimule o pensamento.
Mas como não há regra sem exceção, admito que quando sou confrontada com as mais recentes notícias relativas à realização da PACC – Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades – a que foram obrigatoriamente submetidos os docentes contratados a exercer funções em território continental, o meu discernimento bloqueia e aproxima-se a toda a velocidade do mais extremo radicalismo!
“60% dos Professores chumbou a Português e a Física e Química!” é a noticia da semana, com direito a grande destaque em quase todos os meios de comunicação social, e da qual certamente se orgulhará o Sr. Ministro Crato, que de cima do seu pelouro, teima em não recuar nesta avaliação que pouco ou nada avalia, e que de forma extremamente redutora e injusta, visa essencialmente catalogar os docentes em início de carreira.
Segundo o Ministério da Educação “A realização da PACC visa assegurar mecanismos de regulação da qualidade do exercício de funções docentes, garantindo a comprovação de requisitos mínimos nos conhecimentos e capacidades transversais à lecionação de qualquer disciplina, (…), bem como o domínio dos conhecimentos e capacidades específicos essenciais para a docência (…).” Ora, sendo este o intuito desta prova e sendo requisito indispensável para a docência ter aproveitamento na licenciatura de Educação Básica e no respetivo mestrado integrado, qualquer cidadão é tentado a concluir que o Ministério da Educação recusa-se a aceitar que a licenciatura em causa é tão credível quanto outra qualquer, e que mesmo após 5 anos de estudos, os docentes devem ser novamente avaliados.
Segundo o IAVE – Instituto de Avaliação Educativa, I.P., um em cada três chumbou (854 ao todo) e a média não foi além dos 56% na prova deste ano. Talvez não fosse má ideia ressarcir estes docentes do investimento que fizeram nas suas licenciaturas, considerando que estas não foram capazes de lhes fornecer bagagem suficiente para que concluíssem esta prova de tão grande e decisiva importância com aproveitamento e que o próprio Ministério da Educação se recusa a reconhecer-lhes competência para a docência!
Não leciono, nunca lecionei, mas à semelhança de tantas outras pessoas, investi num curso superior, investi não só a nível monetário como a nível pessoal, dei de mim, privei os meus da minha companhia, esgotei o meu tempo entre estudos, universidade e trabalho.
Não consigo também por isso aceitar que se ignore toda a formação inicial de um docente e se defina o seu futuro com base num exame de duas ou três horas, ignorando não só o trajeto que o antecede como também ignorando e inviabilizando uma avaliação destes professores na sala de aula. Com isto, não quero dizer que tudo vai bem nas nossas Universidades, ou que o curso de Educação Básica não deva ser repensado e reestruturado, até porque a minha experiência me diz o contrário. Mas então porque não se encara esta questão da docência de forma séria, honesta, rigorosa e isenta de politiquices?
Ironicamente toda esta suposta “exigência” com vista à qualidade do ensino cai por terra quando paralelamente se reduz drasticamente o investimento na formação contínua dos professores, quando se aumenta o número de alunos por turma, quando se diminui o número de docentes nas escolas, quando se trata a classe docente com total desrespeito, como se não fossem eles o grande pilar da nossa Educação!
Não posso ainda deixar de lamentar, todo o pormenor tornado público relativamente ao conteúdo desta avaliação, que nada mais acrescenta e que visa essencialmente dar continuidade à humilhação e perseguição, de que a classe docente vem sendo alvo.